Sete filhotes de gambás resgatados após diversos incêndios nas matas de Monte Alto (SP) convivem, há um mês, com uma companheira diferente nos cuidados e reabilitação. Uma cachorrinha “adotou” os filhotes órfãos e, nas imagens feitas há poucas semanas, surpreende ao carregá-los nas costas, até mesmo em um passeio pelas ruas da cidade. Especialistas alertam que, apesar de fofa, situação deve ser evitada e pode ser um risco para os gambás.
A cadelinha do vídeo, apelidada de Jojo Toddynho, pertence à Talita Peixoto, estudante de biologia que tem auxiliado no cuidado dos animais sob orientação de ambientalistas locais. Ela relata que promoveu a interação entre eles quando observou que os filhotes estavam muito tristes. “Eu os coloquei nas costas da Jojo e eles a agarraram imediatamente. Desde então, ela começou a cuidar como se fossem filhinhos dela”, conta.
Os filhotes foram resgatados há pouco mais de um mês por Samuel Maria, amante de natureza credenciado para realizar esses trabalhos no município. Ele conta que, com os incêndios e a seca dos últimos dois meses, foram mais de 40 auxílios aos animais. “Entre eles, quatro eram fêmeas de gambás que, fugindo de queimadas, entraram nas cidades e foram mortas por cachorros. Com essa situação, alguns filhotes morreram, mas esses sete resistiram”, explica.
O número de resgates feitos por Samuel na região de Monte Alto já superou o ano inteiro de 2019: foram 298 auxílios aos animais no ano passado contra 315 atendimentos em 2020.
Amigos ou rivais?
A bióloga Mariana Carolina Hara Motta, uma das administradoras do maior grupo online de cuidados e conservação de gambás brasileiros, ressalta que ataques de cães é provavelmente a maior causa de morte dos gambás nas áreas urbanas. “Uma das formas de evitar esse tipo de situação é não deixar ração dos mesmos exposta durante a noite, que é quando os gambás buscam alimento, visto que são noturnos”, explica.
Diante da situação inusitada da “adoção” dos pequenos pela cadelinha Jojo, a especialista alerta que os filhotes não podem manter os vínculos com cães, já que estarão vulneráveis à ameaça. E ainda acrescenta outros riscos nos cuidados dessa nova “mamãe”: “por questões anatômicas, cães não conseguem alimentar filhotes de gambás, já que eles não sabem ‘sugar’ como outros mamíferos e morreriam de fome. Esse tipo de informação divulgada pode influenciar outras pessoas a tentarem esse tipo de adoção caso se deparem com filhotes de gambás, o que pode ser perigoso e levar a morte desses filhotes”, reforça.
Sabendo desse cenário e evitando que aconteça com os filhotes o mesmo que ocorreu com as mães deles, Samuel e Talita trabalham também para que essa tenha sido uma aproximação momentânea, apenas enquanto eles estavam muito dependentes de carinho e atenção. Os cuidadores, em breve, devem aplicar técnicas para afastá-los do vínculo do cão e até de outros humanos e já apresentaram aos pequenos o enriquecimento ambiental, com estímulos à escalada em galhos e a exploração em hortas.
Reabilitação desafiadora
Assim como cangurus e coalas, gambás são marsupiais, ou seja, possuem uma “bolsa” na qual os filhotes nascem, amamentam-se e se desenvolvem. A ausência dos adultos da espécie, nesses casos, gera desafios para que os cuidadores reproduzam esse ambiente tão protegido. “Filhotes de marsupiais necessitam de fonte de aquecimento constante visto que não produzem calor sozinhos, simulando o calor que receberiam no marsúpio da mãe. A alimentação deve ser de poucas em poucas horas, já que os filhotes ficam acoplados nos mamilos da mãe durante as primeiras semanas de vida”, define Mariana Motta.
Samuel Maria explica como estão cuidado dos filhotes de Monte Alto (SP): “Esquentamos bolsas térmicas no micro-ondas e colocamos panos úmidos para simular esse ambiente do marsúpio. Além disso, é importante dar o leite certo, já que são quase intolerantes à lactose, e depois de um certo tempo começamos a introduzir, frutas, legumes e verduras. Antes de soltá-los vamos ainda vermifugar e acostumar os filhotes com insetos”.
Os gambás precisam também estar ariscos com humanos e com outros animais para que se protejam dessas espécies quando forem soltos e devem saber encontrar, de forma independente, recursos como água, abrigo e alimentos
Se todo o tratamento dos sete filhotinhos de Monte Alto evoluir da forma que está progredindo, os cuidadores acreditam que os pequenos devem ser encaminhados para uma área de soltura no município em alguns meses, assim que atingirem tamanho e pesos ideais, além das habilidades esperadas.
Fonte:Gabriela Brumatti, Terra da Gente