Pesquisadores da Universidade Federal do Piauí descobriram, quase por acaso, uma nova espécie de réptil que viveu na Terra antes mesmo dos dinossauros.

Em 2016, a equipe do professor e paleontólogo Juan Cisneros estava em uma expedição entre as cidades de Palmeirais e Nazária, a cerca de 40 km de Teresina, quando o pneu do carro furou e, com a demora no reparo, o grupo acabou descobrindo uma nova espécie.

O registro da descoberta, entretanto, só foi feito em 2021, nesta terça-feira (12) — segundo o professor, a demora é comum no meio científico por causa da complexidade do trabalho, que pode levar anos para ser finalizado.

“Quando o pneu furou, éramos cinco homens. Quatro ficaram trocando o pneu, enquanto um continuou andando pelo local, resultando na descoberta desse fóssil. Se não tivesse acontecido isso, provavelmente não teríamos feito essa descoberta, a verdade é essa”, contou Cisneros ao G1.


A situação inusitada interferiu ainda na nomeação do animal: Karutia fortunata. “Karutia em língua timbira significa pele enrugada e com caroços. Escolhemos esse nome porque os ossos do crânio do animal estão cobertos por muitas rugas naturais. Fortunata refere-se ao fato de que foi uma descoberta afortunada”, disse.

Área de pedreira

O fóssil foi achado durante pesquisa da UFPI em parceria com seis universidades internacionais e em uma área de pedreiras das cidades. Nesses locais, segundo o professor, os pedreiros fazem escavações “naturais” — mas sem o olhar técnico de um pesquisador podem deixar passar evidências e descobertas científicas importantes.

"Às vezes, alguns deles têm receio de que, se a gente fizer alguma descoberta, pode acabar fechando a pedreira, mas não queremos isso, pelo contrário. Eles escavando estão dando uma ajuda muito grande pra nós", explicou.

“Nós acompanhamos essas escavações para tentarmos alguma descoberta nova. Dessa vez, fizemos esse achado. Assim que vimos a mandíbula do animal, já sabíamos, pelos dentes, que era algo bem diferente do que já tínhamos achado”, disse o professor.


Segundo ele, o animal pertencia a um grupo de répteis conhecidos como “pararrépteis”. Trata-se do terceiro fóssil de réptil descoberto na região de Nazária, mas o primeiro a ser considerado uma espécie nova.

Anterior aos dinossauros e sem descendentes

Juan Cisneros disse que, por fora, o animal era parecido com um calango ou lagarto comum, que media cerca de 25 cm de comprimento e se alimentava de insetos que existiram na floresta fóssil do Rio Poti, em Teresina.

Contudo, ele é um parente muito distante dos calangos de atualmente, pertencente a um grupo totalmente extinto, que não deixou descendentes. A estimativa é de que ele tenha vivido na terra há 280 milhões de anos, no Período Permiano da Era Paleozoica, antes mesmo dos dinossauros.

Descoberta ajuda a entender Pangeia

Segundo Cisneros, a descoberta ajuda a entender como era o Brasil na época da Pangeia e também aponta semelhanças entre a fauna brasileira e dos Estados Unidos, indicando como era a vida na Terra quando os continentes eram unidos.

“Ele nos ajuda a reconstruir as relações ecológicas do final da Era Paleozoica e através dele temos um panorama mais completo do Brasil nesse tempo. E nos ajuda a entender melhor as relações entre a fauna brasileira e a fauna dos EUA numa época em que os continentes estavam unidos, formando o supercontinente de Pangeia”.

Desde 2016, os pesquisadores estudam a coleção de fósseis encontrados no município e que atualmente estão depositados no Museu de Arqueologia e Paleontologia da UFPI.

As várias partes do corpo do fóssil, dentre eles ossos do crânio, da mandíbula, vértebras, e de outras partes do esqueleto, foram analisadas e estudadas por uma equipe liderada por Cisneros, que é diretor do Museu de Arqueologia e Paleontologia da UFPI. O trabalho foi feito em conjunto com uma equipe internacional de paleontólogos das seguintes instituições: Museu de Ciências Naturais da Carolina do Norte (EUA), Museu Field de Chicago (EUA), Museu Iziko (África do Sul), Universidade de Buenos Aires (Argentina), Universidade Humboldt (Alemanha), Museu de História Natural (Reino Unido).

O estudo sobre o fóssil do Karutia fortunata foi apresentado recentemente na revista "Journal of Systematic Palaeontology", considerada referência na área da Paleontologia.

“Este estudo fortalece as pesquisas paleontológicas feitas pela UFPI e foi possível graças ao apoio do CNPq e da prefeitura de Nazária”, disse.

Fonte : G1

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